Em contextos de ditadura e repressão, o movimento adquire enorme potencial em termos da sua capacidade de disrupção e de resistência (estética). Através do exílio, da migração, da viagem ou da correspondência, corpos, ideias e objectos são permanentemente deslocados, numa procura incessante de linhas de fuga impossíveis de fixar por qualquer regime político. No campo das artes visuais, a natureza elusiva e mutável do movimento tem a capacidade de transformar objectos em eventos, criando redes afectivas de imagens, palavras, objectos, ideias e relações. O potencial ideológico do movimento encontra-se de forma bastante vívida nas publicações de artista, ou na arte em forma de matéria impressa, tal como livros de artista ou mail art, os quais conseguem contornar as limitações físicas impostas por aparelhos repressivos. Da mesma forma, o movimento activa a imaginação, impele-a a juntar elementos de uma rede de colaborações que é assim construída e posta, também, em movimento. O exercício a que nos propormos com este artigo implica olhar mais de perto certas condições materiais e históricas inerentes a certos objectos artísticos, condições essas que os impregnam de camadas ideológicas diversas. Assim, ao considerar a triangulação movimento-tempo-espaço, tenho o objectivo de investigar a forma como várias artistas, mulheres, usaram diferentes tipos de matéria impressa para rever, confrontar e pôr a nu certas narrativas totalizantes, tais como o papel das mulheres na sociedade, o capitalismo, a escravatura, o colonialismo, etc., que foram sustentadas e simultaneamente sustentaram os regimes repressivos e ditatoriais que vigoraram em Portugal e no Brasil.
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