Abstract
Este artigo percorre a temática do exílio colonial. Louvando nos registos escriturários produzidos pelos portugueses deportados para o Tarrafal, na colónia de Cabo Verde, entre 1936-1954, exumaremos do espólio desse memorialismo diferentes tópicos que transcrevem o teor da experiência. Num primeiro momento, traçaremos uma breve genealogia histórica do exílio colonial sob o regime de Salazar (Estado Novo). Seguidamente, dos registos escriturários dos exilados, exumaremos algumas observações temáticas, nomeadamente, a caraterização do espaço, a situação colonial, as visões acerca da população nativa e os espectros da diferença colonial.
 
Highlights
Pode a experiência de exílio prescindir de aventuras? E pode o exilado, na falta de outras graças, subtrair-se do espaço que o cerca? Não
The present paper addresses colonial exile
I will analyze different topics of the experience of the Portuguese sent into exile in the colonial prison of Tarrafal, in Cape Verde, between 1936 and 1954
Summary
Daqui, a ilação geral mais consequente a colher disso tudo é esta: a míngua que oprimia a situação colonial dos cabo-verdianos e a repressiva política de privação exercida sobre os desterrados no Tarrafal tinham uma mesma matriz: o projeto de poder e de dominação de um regime que, por um lado, criminalizava os seus adversários políticos e, por outro, colonizava e exercia autoridade político-administrativa sobre as populações dos territórios colonizados, porém, sem lhes oferecer devido amparo quando tal se afigurava necessário. Basicamente, a esses africanos, os escritos dos exilados não atribuem grande agência aos seus atos (enquanto sujeitos ativos a atuar de modo informado no interior de um sistema repressivo, colonial e de exploração imperial); nem lhes reconheciam grande autonomia histórica, mesmo quando a autoridade que exerciam sobre os deportados colocava em evidência diferentes níveis de dominação e diversas geometrias de subordinação às estruturas e ramificações do poder colonial dominante. Significa que se os africanos estavam submetidos pelo potentado colonial (Sousa 1978: 67-68) – o que os tornava por vezes «mais vítimas do que culpados» – (Rodrigues 1974: 130), neste caso, os exilados estavam duplamente subjugados, primeiro, pelo regime que mantinha a dominação colonial, segundo, pelos agentes subalternos locais (aqueles colonizados) que, colaborando na manutenção da estrutura imperial e da ordem colonial – eles «também vítimas inocentes do grande drama que nos prostra a [todos] nós» (Rodrigues 1974: 51) –, nada mais eram do que um prolongamento do próprio poder dominante
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