Nesta investigação analiso os documentos que constam no acervo da maestrina e compositora Chiquinha Gonzaga, hoje em posse do Instituto Moreira Salles do Rio de Janeiro. Trata-se de um material que começou a ser colecionado pelas mãos da própria artista, pelo qual foram conservados inúmeros fragmentos de sua própria vida, suas memórias, sua trajetória pessoal e profissional, de modo que, parte deste material, analiso como “representações de si”, ou seja, como possibilidade de narrativas autobiográficas. Com base nas noções de “cultura de si” e “formações discursivas”, de Foucault (2015), “biografemas”, de Barthes (1977), e “pacto autobiográfico”, de Lejeune (2014), recorro à Análise do Discurso, partindo do fundamento de que os conhecimentos que compõem o acervo constituem um sistema de enunciados, verdades parciais, intepretações históricas e culturalmente constituídas; portanto, mais do que descrevê-lo e interpretá-lo, interessa-me compreender os contextos – social e simbólico – de como o acervo foi constituído, modificado e produzido. A análise do material problematizou os mecanismos pelos quais os discursos e narrativas sobre a vida e obra de Chiquinha Gonzaga atravessaram o tempo, assim como as implicações do arquivamento da própria vida. Além disso, a análise revela o acervo como uma fonte privilegiada para compreensão do universo social feminino, uma alternativa diante da ausência de informações sobre artistas mulheres na historiografia musical brasileira, na qual, muitas vezes, a presença feminina é ignorada e desvalorizada.