Nas últimas quatro décadas, a distância entre geógrafos “humanos” e “físicos” tem contribuído para o prolongamento e até o agravamento de vários preconceitos: entre eles, podemos citar a desvalorização ou insuficiente valorização, por parte dos geógrafos “humanos”, do conceito de ambiente (equivocadamente reduzido, quase sempre, à ideia de um “ambiente natural”, quando na verdade se trata de um conceito potencialmente holístico e integrador), e o desinteresse ou ceticismo a propósito da construção de objetos de conhecimento (objetos epistêmicos) “híbridos”, que combinem conhecimentos oriundos das ciências sociais e naturais. Além disso, a capacidade dos geógrafos de participar de vários debates públicos - da mudança climática global e seus impactos sócio-espaciais à produção social de desastres ambientais - e de granjear reconhecimento e visibilidade como atores científicos relevantes sobre essas questões tem sido severamente restringida. Tudo isso porque, nas décadas de 1970 e 1980, a esmagadora maioria dos geógrafos que influenciaram e protagonizaram a “virada crítica” ou “radical” da disciplina (que foi, essencialmente, uma virada marxista, uma vez que as contribuições libertárias foram largamente negligenciadas e marginalizadas) erroneamente acreditou que para alcançar profundidade e densidade em termos de análise crítica da sociedade seria conveniente ou necessário voltar as costas ao conhecimento de processos e fatores geoecológicos, como se estes fossem, em última instância, desimportantes ou um mero diversionismo. Começando nos Estados Unidos na década de 1980, e depois fazendo-se presentes também na América Latina e em outras partes do mundo, debates, conflitos e ativismos em torno da justiça ambiental têm tacitamente desafiado os geógrafos a repensarem a fragmentação intradisciplinar com a qual a maioria parece viver confortavelmente (ou mostrando apenas um desconforto retórico, de tempos em tempos e sem consequências práticas). Dentro de um quadro de resistência e práxis emancipatória, os atores comprometidos com a luta contra a injustiça ambiental articulam, em seu cotidiano, as ideias de ambiente (o contexto sócio-natural em que vivem), território (a projeção espacial das relações de poder) e lugar (o tecido das identidades sócio-espaciais); mas é precisamente essa articulação fundamental que, no entanto, como está implícito no que foi dito no parágrafo anterior, os geógrafos geralmente não têm conseguido apreciar adequadamente. Além disso, esses atores têm sido frequentemente forçados pelas circunstâncias não apenas a combinar conhecimento vernacular (dito “local”) com conhecimento científico, mas também, no que diz respeito a este último, a perceber a necessidade de coletar informações sobre questões relacionadas a processos e problemas de ordem geoquímica, ecotoxicológica, geotécnica etc., a fim de ser melhor informados (e, portanto, politicamente mais eficazes) sobre coisas como os riscos à saúde causados por contaminantes ambientais, riscos de deslizamentos, desmoronamentos e outros desastres, e assim sucessivamente. O que a luta pela justiça ambiental fortemente exemplifica, em poucas palavras, é a necessidade de os geógrafos entenderem a importância de construir e valorizar objetos de conhecimento “híbridos” para lidar com problemas complexos. A menos que compreendam esse ponto, é provável que não apenas sua relevância científica, mas sobretudo sua relevância social, permaneçam desnecessariamente limitadas (ou até mesmo sofram atrofia), especialmente dada a enorme magnitude, o amplo alcance e a elevada visibilidade política dos desafios ambientais contemporâneos.