Abstract
Analisou-se, neste artigo, a emergência e a disseminação dos saberes especializados em psiquiatria do desenvolvimento para a infância e adolescência no Brasil. A partir de investigação bibliográfica e documental, observou-se que esses novos arranjos em psiquiatria surgem a partir da aproximação da psiquiatria às neurociências nas últimas décadas, e configuram um modelo teórico cujos fundamentos se assentam em explicações sobre o desenvolvimento cerebral. Assim, após recrutamento de milhares de crianças e adolescentes diretamente das escolas para realização das pesquisas, pretende-se identificar cada vez mais precocemente indivíduos em risco de desenvolver os transtornos mentais e, assim, poder criar novas tecnologias diagnósticas e terapêuticas que atuem no âmbito da prevenção. A análise das iniciativas realizadas por esse grupo de psiquiatras ao longo da última década permite afirmar que a legitimação e disseminação desse novo paradigma na sociedade concorre fortemente para a ampliação da medicalização da infância e do espaço escolar no país.
Highlights
Discutiu-se, neste artigo, a emergência e a disseminação dos saberes especializados em psiquiatria do desenvolvimento para a infância e adolescência no Brasil
Sob a justificativa de que a maior parte dos transtornos mentais tem início em fases precoces da vida e que estes representam as maiores fontes de incapacitação e gastos em saúde pública e também que, conforme dados epidemiológicos, somente 20% das crianças brasileiras com problemas de saúde mental obtêm acesso a cuidados adequados, a rede de profissionais especializados do INPD organizou uma verdadeira força-tarefa para disseminar nacionalmente os conhecimentos produzidos por suas pesquisas que conjugam os saberes da psicopatologia desenvolvimental, das chamadas neurociências e as novas tecnologias em neuroimagem, e objetivam a detecção precoce dos transtornos mentais com vistas à prevenção
Ressalta-se, uma vez mais, que essas diversas iniciativas da psiquiatria do desenvolvimento no Brasil envolvendo o mundo digital e o universo escolar expressam a existência em curso de uma nova tentativa de legitimação e fortalecimento do poder psiquiátrico no governo dos sentimentos e condutas de crianças e adolescentes, e este se impõe especialmente na escola
Summary
Este artigo objetiva analisar a emergência de um novo subcampo em psiquiatria no Brasil no século XXI: a psiquiatria do desenvolvimento, que se apresenta como um novo paradigma e cujo marco principal é a inauguração do Instituto de Psiquiatria do Desenvolvimento para a Infância e Adolescência (INPD) em 2009. A partir de um olhar genealógico à luz de Foucault (2006, 2010, 2011) e por meio de pesquisa bibliográfica e documental – com destaque para a análise dos relatórios acima mencionados –, investigou-se a agenda de pesquisas do INPD, seus fundamentos, objetivos e principais enunciados, buscando desvelar as rupturas e continuidades em termos teóricos-epistemológicos que se apresentam no discurso psiquiátrico em perspectiva histórica. Também foram tomados como objetos de análise os projetos e programas realizados ao longo da última década e as estratégias de disseminação e legitimação dos saberes especializados em psiquiatria do desenvolvimento na sociedade, sobretudo no universo escolar. Beneficiando-se, portanto, de credibilidade institucional e amplo financiamento para suas iniciativas, observou-se que a consolidação e a disseminação desse novo paradigma em psiquiatria na sociedade, que a propósito já conseguiu espaço para orientar políticas públicas, vêm concorrendo fortemente para a ampliação do processo de medicalização da vida pela psiquiatria, sobretudo no domínio da infância
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