Abstract

Este artigo pretende reanalisar parte da produção literária brasileira dos anos 1980, a partir das contradições de uma década marcada, simultaneamente, pelo arrebatamento e pelo terror. Período caracterizado pela euforia em torno da redemocratização, o decênio é também impactado pela descoberta da AIDS como pandemia, acontecimento responsável pela regulação dos corpos — ocasionada pela ênfase na prática do sexo seguro — e pela estigmatização da homossexualidade. Em Aids e suas metáforas, Susan Sontag (1989) analisa o imaginário em torno da doença, cujos desdobramentos seriam tanto o recrudescimento do preconceito contra homossexuais quanto a culpabilização das vítimas do vírus. Quando retomados e associados ao contexto brasileiro, os argumentos de Sontag (1989) assumem conotações distintas, que permitem revisitar a literatura brasileira a partir do olhar que as manifestações do período direcionaram à pandemia (recorte praticamente ignorado pela historiografia e pela crítica literária). Esse viés também permite refletir sobre a “utilidade” que a insistente exploração das metáforas ligadas à AIDS pode ter assumido. O desenvolvimento dessas propostas tomará os contos “Linda, uma história horrível” e “Depois de agosto”, ambos do escritor brasileiro Caio Fernando Abreu (1988; 1995), como referências para a análise.

Highlights

  • The decennium, period characterized by euphoria around the redemocratization, is impacted by the emergence of AIDS, an event responsible for the redisciplination of the bodies – caused by the emphasis on the practice of safe sex – and the stigmatization of homosexuality

  • When resumed and associated to the brazilian context, Sontag’s arguments assume distinct connotations that enable a revisitation of the brazilian literature from a scope directed to the pandemic by the artistic expression

  • It is possible to consider the “utility” that the insistent metaphorical explorations linked to AIDS may have supported

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Summary

Metáforas da pandemia

A AIDS, termo originário do inglês Acquired Immunodeficiency Syndrome e traduzido para o português como Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (SIDA), foi reconhecida como doença mundial a partir da década de 80, momento em que sua expansão teve grande repercussão no Brasil. Beto é, por outro lado, eufemisticamente por ela denominado como “amigo” do personagem: “– Isso que é amigo, meu filho. O seu sentimento de desamparo, ligado à estigmatização provocada pela doença, estabelece uma espécie de barreira entre mãe e filho, obstáculo que ele não consegue transpor. Debilitado, o filho escolhe a casa da mãe, em uma cidade interiorana, Passo da Guanxuma, para abrigar-se, refugiar-se, não da doença, que, irremediavelmente o acompanhará, mas da sociedade que o acusa, que o vê como corporificação de todas as metáforas degradantes e depreciativas associadas à condição de infectado. O acúmulo de imagens e de inferências presente no fragmento não só remete ao uso dos medicamentos para tratar a doença, como também direciona à ideia de que o tratamento da enfermidade consome seu tempo restante de vida. A ausência de nomes próprios em ambos os contos de Abreu (apenas a cadela Linda é nomeada) sugere uma espécie de despersonalização, como se cada personagem representasse diferentes facetas de um drama que afligiu e/ou vitimou toda uma geração

Considerações finais
NOTAS DE AUTORIA
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