Abstract

Na segunda metade do século XX, o Terceiro Mundo emergiu como uma importante categoria política, orientando formas de se estar e situar em relação ao mundo, como atestado pela Conferência Tricontinental realizada na Havana de 1966. Este trabalho estuda uma publicação fundada pelo encontro, a revista Tricontinental, com o objetivo de compreender seus esforços para tecer os laços políticos e discursivos que deveriam unir essa coletividade. Para essa construção do Terceiro Mundo, a revista mobilizou debates teóricos e figurações narrativas, além de engendrar redes transnacionais de solidariedade. Nas páginas da publicação, o conceito de Terceiro Mundo ganhou contornos multifacetados e se entrelaçou a aportes teóricos como a Teoria da Dependência e as apropriações do marxismo por movimentos de libertação nacional. Figurações compartilhadas – como o oximoro no relato dos antagonismos coloniais ou o tom heroico das narrativas sobre a luta armada e seus protagonistas – demonstram as elaborações simbólicas e dimensões sensíveis desse empreendimento. Em seus bastidores, por sua vez, o processo de edição da Tricontinental permite constatar o papel da publicação em ter engendrado itinerâncias e redes intelectuais que conectaram intelectuais e militantes ao redor do globo. O Terceiro Mundo, portanto, esteve intimamente relacionado com a Tricontinental, não só na medida em que mobilizou sua fundação, mas também por que viria a ser ele próprio construído por esse projeto editorial.

Highlights

  • the Third World emerged as an important political category

  • This work studies a publication founded by the meeting

  • itself built by this editorial project

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Summary

Lídia Maria de Abreu Generoso

Durante a Conferência Tricontinental, quando perguntado sobre o papel dos intelectuais nos processos de libertação nacional, Roberto Fernández Retamar (1966, p. 18) respondeu que “a Revolução Cubana se internacionalizou, não só na medida em que influencia o mundo, mas também na medida em que se explica por esse mundo tomado em seu conjunto”.1 O cubano afirma que o papel de um intelectual, além de exercer suas tarefas cidadãs interpretando e participando ativamente do processo revolucionário, seria produzir compreensões acerca do “nosso mundo, o mundo subdesenvolvido, o Terceiro Mundo”. O objetivo deste artigo é compreender de que modo a revista Tricontinental se relacionou com o Terceiro Mundo, conceito que não só está na base da criação desse projeto editorial como foi apropriado, transformado, reinterpretado e impulsionado por ele. Ainda que esses atores não tenham rompido com ideais de desenvolvimento e industrialização que são marcadamente característicos do período, suas observações demonstram um olhar crítico perante essas questões mesmo no interior dos debates sobre o Terceiro Mundo. Tricontinental e seus colaboradores não abriam mão de defender a solidariedade entre os povos dos três continentes e, portanto, de uma valorização do conceito de Terceiro Mundo como catalizador de um projeto político coletivo em torno da solidariedade e da luta anticolonial e anti-imperialista. Entretanto, não há uma única resposta à questão sobre “o que conforma o Terceiro Mundo na Tricontinental?”, mas múltiplas referências mobilizadas por uma comunidade de discurso que busca pensar, elaborar e demarcar não só a diferença em relação ao outro, mas a semelhança, as alianças possíveis entre nós

ITINERÂNCIAS E SENSIBILIDADES TRICONTINENTAIS
CONSIDERAÇÕES FINAIS

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