Abstract

A pesquisa apresentada neste artigo, inscrita na Linguística Aplicada e inserida nos marcos teórico-metodológicos da Análise da Conversa (Sacks, 1992; Sacks; Schegloff; Jefferson, 1974) de natureza etnometodológica (Garfinkel, 1967), descreve e analisa qualitativamente interações entre um conselheiro tutelar e duas crianças vítimas de abuso sexual. Assumindo a necessidade de entender o abuso sexual de forma mais interdisciplinar, pesquisas sobre o uso situado da fala e sobre as práticas narrativas com crianças podem contribuir para evitar o fenômeno da revitimização institucional (Cézar, 2007). Durante a empreitada interacional de reconstruir o evento de abuso, é possível identificar que o conselheiro tutelar se orienta para a sua meta de construir um relatório convincente e reportável para o sistema judiciário (i.e. Promotoria da Infância e da Juventude; Ministério Público), conduzindo a atividade de modo a contemplar as evidências que ele julga necessárias. Os contornos da narrativa são, então, construídos de acordo com a ação que ela desempenha na interação (i.e. garantir medida de proteção para a vítima e punição para o/a agressor/a). Em especial, a análise dos dados aponta que o conselheiro se envolve ativamente na ação de significar a experiência com a vítima, acionando diversas estratégias interacionais, dentre as quais a formulação de perguntas polares e a oferta de itens lexicais, para descrever os sentimentos da criança. O engajamento do conselheiro na ação de significar a experiência acaba por assumir um valor prescritivo de significação da experiência do abuso e de performance da identidade de vítima (Ehrlich, 2002; Trinch, 2013). Ao realizar a atividade de significar as experiências das vítimas, o conselheiro faz emergir na fala-em-interação os valores morais que permeiam o discurso jurídico, que são também elementos de socialização das crianças sobre como sentir e falar sobre a violência sofrida. Estudos com a interface linguagem e violência sexual contribuem também para equacionar o dilema da necessidade de construir narrativas reportáveis ao sistema judiciário sem retirar a agentividade da vítima em significar a sua experiência. Além disso, podem servir de insumo para os/as profissionais que acolhem narrativas de crianças vítimas.

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